O crescimento constante da população mundial levou a que esta atingisse os 8 mil milhões de habitantes no início de 2024. Espera-se que doravante cerca de 90% desse aumento provenha dos países africanos. Este crescimento populacional, sem suporte de um desenvolvimento económico adequado, contribui para a pobreza, destacando-se a persistência da desnutrição em países em desenvolvimento, incluindo a Guiné-Bissau. Além disso, a procura crescente por alimentos de origem animal não é correspondida pela produção local (Herrero et al. 2014). Neste contexto, o consumo de ovos e carne de frango emerge como uma fonte acessível de proteína, sendo o frango atualmente uma das melhores opções para as populações de baixa renda, devido ao seu baixo teor de gordura e à ausência de restrições religiosas (Wiesmann, 2007). A carne de frango representa cerca de 90% da produção total de carne de aves em todo o mundo (Alice, 2016).
No continente africano, destaca-se a existência de dois principais sistemas de produção avícola: a avicultura comercial (intensiva) e a avicultura de aldeia (extensiva). A avicultura comercial opera numa escala média a grande, utilizando genética aprimorada e raças exóticas criadas de maneira intensiva em instalações que garantem alimentação, saúde e bem-estar às aves em grande escala, com retornos relativamente altos. Em contraste, a avicultura de aldeia opera numa escala muito menor, utilizando raças autóctones de aves com produtividade inferior. Importa, por conseguinte, desenvolver um sistema de produção intermédio, situado entre o nível comercial e o nível de aldeia. Foi essencialmente este o impulso para o desenvolvimento sustentável da avicultura da Guiné-Bissau deixado pela Ação Ianda Guiné! Galinhas ao longo dos últimos 5 anos.
A Ação Ianda Guiné! Galinhas focou a sua intervenção em torno de 4 grandes eixos, a saber:
- Reforço das competências das empresas sociais e operadores da fileira
A ação apoiou o desenvolvimento das empresas CEDAVES e Piu Piu Awara para atuarem como operadores estratégicos para fornecimento de insumos essenciais à fileira avícola, nomeadamente os pintos de dia e ração. Foram apoiados operadores complementares para a produção de matérias-primas para a ração, como a produção de farinha de peixe seco e farinha de cascas de ostra, bem como armazéns comunitários para facilitar o acesso a insumos avícolas a nível regional. Só a CEDAVES dispõe de um efetivo de mais de 15 mil galinhas poedeiras e uma fábrica de rações onde foram testadas diferentes formulações para incorporação de produtos locais.
- Programa avicultura Familiar (PAF)
O PAF beneficiou 104 avicultores de pequena e média dimensão, dotando-os de raças de aves adequadas, ou seja, adaptadas às condições locais e apropriadas para a escala intermediária de produção. Os avicultores familiares foram apoiados na implementação de práticas de alimentação eficientes para garantir a saúde e o bom crescimento das aves. Para o efeito foram desenvolvidas infraestruturas adequadas, ou seja, instalações que atendem às necessidades das aves e permitem um maneio eficiente (abrigo, alimentação, água e cuidados de saúde).
- Programa de saúde através de formação, vacinação e assistência sanitária
Para garantir a viabilidade dos efetivos animais é essencial implementar práticas de maneio sanitário que previnam doenças e promovam a saúde das aves. O programa de saúde avícola passou pela formação através de cursos técnicos de avicultura e de ações de capacitação aos técnicos da Direção-geral de Pecuária. No total foram formados 62 empreendedores, em 3 cursos realizados numa parceria com a Escola Superior Agrária do Instituto Politécnico de Bragança, Portugal, e com a Escola de Artes e Ofícios de Quelele, Bissau. No final do ano de 2023 foi disponibilizado o “Manual de Produção e Sanidade Avícola” o qual sistematizou os conteúdos pedagógicos do curso técnico de avicultura.
Houve também um reforço de capacidades da Direção-geral de Pecuária, quer a nível das técnicas de avicultura moderna, quer a nível de colheita de amostras biológicas e técnicas laboratoriais. Foram formados 11 técnicos da DGP, dos quais 6 homens e 5 mulheres.
A par da capacitação formal, foram promovidas ações de formação descentralizadas em 2023, designadamente em Bambadinca, Bissau e Bula. Cada uma destas localidades concentrou os produtores da PAF das regiões limítrofes. Assim, foram beneficiadas 6 regiões da Guiné-Bissau e 73 avicultores foram formados.
Para contribuir para a saúde das aves é fundamental proceder à vacinação dos efetivos. Em 2023 realizaram-se a 7.ª e 8.ª campanha de vacinação contra as doenças Newcastle e gripe aviária (H9N2). No decorrer das 8 campanhas já realizadas até 2023 foram apoiadas 305 tabancas/bairros nas quais foram apoiadas 2 758 famílias de avicultores por via da vacinação dos seus aviários, perfazendo um total de 162 996 aves vacinadas.
Os avicultores requerem acesso a serviços de apoio à saúde animal, designadamente de acesso a medicamentos. A Ação Ianda Guiné! Galinhas apoiou a abertura de 3 farmácias veterinárias localizadas em Gabu (Farmácia veterinária DGP de Gabu), Bafatá (ANTEPROVET), e Bissau (CLIFAVET). Foram promovidas 2 formações para a capacitação dos técnicos e proprietários das farmácias veterinárias, designadamente nas áreas de: farmacologia, gestão e utilização responsável de medicamentos; e gestão de negócios, marketing e comunicação. No total foram formados 11 técnicos dos quais 10 homens e 1 mulher. Foi igualmente introduzido um programa de gestão de farmácias que permite a gestão de estoques, gestão contabilística das farmácias, gestão de validades dos medicamentos e gestão de receitas, permitindo desta forma optimizar o funcionamento das farmácias. Para apoio às farmácias e criadores foi publicado e disponibilizado o “Guia de Interpretação da Bula dos Medicamentos e Biossegurança Aviária”.
- Trabalho em rede e promoção de feiras
A ação contribuiu para o reforço da UPCA – União de Produtores da Cadeia Avícola, a qual conhece uma nova fase na sua história, com uma liderança feminina, sendo que a maioria dos avicultores na Guiné-Bissau são mulheres. A UPCA constitui-se como a legítima representante dos criadores avícolas, apelando à proteção e apoio ao desenvolvimento da avicultura familiar e rural.
Ao mesmo tempo foi reforçada a APAV-GB – Associação de Paraveterinários da Guiné-Bissau para apoio aos avicultores e criadores de gado na prestação de cuidados veterinários, bem como promover uma estreita cooperação com a Direção-geral de Pecuária, designadamente nas campanhas de vacinação.
Ao longo do projeto foram promovidos intercâmbios e feiras avícolas para potenciar o crescimento da avicultura a nível nacional, aproveitando a ocasião para promover discussões e aprendizagens, bem como potenciar o negócio de avicultores e agricultores. Em 2023 decorreu a feira agroecológica de 15 a 22 de dezembro de 2023, a qual a par da avicultura, numa parceria entre ações do Ianda Guiné!, abrangeu os produtos hortícolas nacionais. Na feira, 40 produtores e criadores entrevistados referiram terem conseguido comercializar 80% dos seus produtos (em média) e alcançado uma receita média de 490.000 XOF (747 €).
A Ação Ianda Guiné! Galinhas foi implementado pela ONG italiana MANI TESE, pela ONG Portuguesa IMVF, pela ONG guineense Asas de Socorro e pela Universidade de Turim, com o apoio do Instituto Politécnico de Bragança, no âmbito de Ianda Guiné!, um programa da União Europeia desenvolvido em parceria com oito ações complementares, coerentes e harmonizadas que concorrem para o mesmo objetivo: promover soluções para problemas sociais e novas oportunidades económicas.